ENFOQUE
O OFICIAL DE JUSTIÇA E AS CITAÇÕES INVÁLIDAS
NAS NOVELAS DA GLOBO
Raugir Lima Cruz*
Insistindo
em analisar algumas situações jurídicas mostradas
em novelas, em especial as da Rede Globo, continuamos na linha do artigo
anterior no qual trouxemos crítica para uma sentença penal
condenatória. Desta feita examinamos o ato de citação
realizado por Oficial de Justiça nos folhetins da rede de TV.
Observamos que, nas
novelas, sempre que algum personagem é citado sobre algum processo,
a cena se desenrola da seguinte forma: “alguém avisa para
o personagem a ser citado que um Oficial de Justiça o procura,
quando este é autorizado a entrar no recinto, indaga pelo nome
do citando e após a confirmação de estar diante da
pessoa procurada, o oficial diz ter uma citação ao tempo
que entrega um envelope e requer que o recebedor assine na outra via do
mandado, se despede e depois retira-se do local”.
Mostraremos que essa
diligência da forma descrita acima se caracteriza por uma citação
inválida, em total desobediência ao previsto nos códigos
de processo. Antes, necessário se faz uma rápida explicação
do que vem ser a citação e a sua grande importância
para a efetivação de um processo válido.
O artigo 213 do Código
de Processo Civil reza que, “Citação é o ato
pelo qual se chama a juízo o réu ou o interessado a fim
de se defender”. Portanto, é o ato através do qual
o réu fica sabendo que existe um processo contra ele. É
exatamente neste momento que o réu, seja em processo criminal,
trabalhista ou qualquer outro processo civil, independente de sua vontade
é incluído na relação processual, dando-lhe
a oportunidade de defesa.
A importância
deste ato é tamanha que, se o Oficial de Justiça realizar
a citação sem a observância de uma de suas prescrições
legais, este procedimento pode ser caracterizado como um ato nulo, anulável
ou ainda irregular, dependendo da análise do caso concreto. Tudo
se explica porque a citação é um requisito de validade
da relação processual, pois o réu só se vincula
ao processo formando a relação triangular entre autor, réu
e juiz, após a citação válida.
Interessante observar
que os leigos costumam falar que o Oficial de Justiça entregou
ou vai entregar a citação ou a intimação,
caindo em erro absurdo, visto que tal serventuário da justiça
não entrega citação ou intimação, dentre
outros atos. É de ficar bem claro que o Oficial de Justiça
cita ou intima o réu, bastando a dicção do artigo
226 do Código de Processo Civil para confirmar o alegado acima:
“Incumbe ao oficial de justiça, procurar o réu e,
onde o encontrar citá-lo”. Observe-se a expressão
citá-lo e não entregar a citação.
Insta salientar que
os incisos do artigo acima transcrito demonstram que os atos realizados
pelos oficiais de justiça das novelas são atos inválidos,
totalmente em desacordo com o previsto na lei, senão vejamos: O
Oficial de Justiça ao encontrar o réu deve citá-lo:
“I – lendo-lhe o mandado e entregando-lhe contrafé;
II – portando por fé, se recebeu ou recusou a contrafé,
III – obtendo a nota de ciente, ou certificando que o réu
não a apôs no mandado”.
Trocando
em miúdos, o Oficial de Justiça ao encontrar o réu,
faz-se identificar e em seguida cita por todo o teor do mandado, lendo
este e a petição inicial, de forma que a pessoa que está
sendo citada tenha total ciência do que está ocorrendo, após
entrega uma via do mandado (chamada de contrafé) quando o citando
assina a outra via (chamada de “fé”).
Entretanto, o procedimento
não termina aqui, posto, o Oficial de Justiça escreverá
(digitará) uma certidão descrevendo a diligência,
informando que citou o réu por todo o teor do mandado, entregou
a contrafé e se o citado assinou ou recusou-se de exarar a assinatura
como nota de “ciente”, datando e assinando ao final, para,
por fim, devolver o mandado aos autos do processo.
Esclarecendo
que a falta da certidão também acarreta nulidade e que o
Oficial de Justiça tem fé pública, de forma que seus
atos e certidões nos processos presumem-se verdadeiros, e se alguma
parte levantar dúvida terá que assumir o ônus de provar
o que alega.
Além
de tudo, no Processo Penal, a regra geral é a citação
por Oficial de Justiça através de mandado, não havendo
previsão para que tais atos se efetivem por outro servidor do judiciário.
Finalizando, o ingresso na função de Oficial de Justiça
se dá por Concurso Público, exigindo-se na Justiça
Federal, Justiça do Trabalho e em quase todas as Justiças
Estaduais que o candidato seja portador do diploma de Bacharel em Direito.
Obs.:
Se você tem alguma curiosidade ou dúvidas sobre seus direitos,
nos envie um e-mail para raugirlima@hotmail.com que tentaremos esclarecê-las
nos próximos artigos.
(Publicado
no jornal ,
Ano XXXV, nº 117, Maio/2011).
Untitled Document
*Raugir
Lima Cruz. Oficial de Justiça da Comarca de Quixelô-CE.
É mombacense de Senador Pompeu, Ceará, onde nasceu no
dia 15 de janeiro de 1966, filho de Etevaldo Lima Cruz e de Francisca
Zeneida Lima Cruz. Graduou-se em Pedagogia na Faculdade de Educação,
Ciências e Letras de Iguatu - FECLI. É bacharel em Direito
e pós-graduado em Direito Penal e Criminologia pela Universidade
Regional do Cariri - URCA. Obteve o 2º lugar no Concurso Literário
Rachel de Queiroz, promovido em 2006 pelo Fórum Clóvis
Beviláqua em comemoração aos 30 anos da sua biblioteca,
com a crônica .
A sua crônica foi publicada na coletânea “Sertão:
olhares e vivências” com os dez trabalhos classificados
no referido concurso. No dia 18 de dezembro de 2007 recebeu o título
de cidadão quixeloense concedido pela Câmara Municipal
de Quixelô. É autor dos artigos "Uma análise principiológica e legal das interceptações telefônicas: a produção probatória à luz do princípio da proibição da proteção deficiente", publicado na edição nº 87, ano XIV, abril/2011, da Revista Âmbito Jurídico e “A aplicação da Willful Blindness Doctrine na Lei 9.613/1998: A declaração livre e a vontade consciente do agente”, publicado no volume nº 9, edição 2011, da Themis, revista científica da Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará (ESMEC).
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