ARTIGOS
MULTIPLICAÇÃO DE MORTOS
Mombaça
na década de 1970
José
Elcias Lustosa da Costa*
Chefe
político da Mombaça decidiu eliminar correligionário
que o havia traído nas eleições. Recebera o dinheiro
combinado e passou todos os votos para o inimigo, dificultando a eleição
do filho para deputado estadual. A combina não foi cumprida e os
votos não apareceram. O salafrário desfilou com o inimigo
vitorioso e debochou da derrota do ex-amigo.
O
coronel deixou o tempo passar, engoliu a raiva, esperou acabar o entusiasmo
da vitória e o calor da ira, a fim de resolver a pendência
de maneira mais eficiente e sem deixar rastro. Sentou no toco, comendo
rapadura a espera da hora aprazada para resolver a questão. Contratou
pistoleiro da Paraíba, afamado e acertou a eliminação
do inimigo quando ele já estava esquecido da desavença,
até já se cumprimentavam. O acerto foi em Fortaleza, quando
entregou ao matador três fotos, uma de frente e duas de perfil,
esquerdo e direito, da futura vítima. Como tinha casa na capital,
lá ficou por mais de três meses, onde soube da notícia
da morte e compareceu ao enterro compungido, enviando coroa de flores
aceita, apesar das desconfianças dos parentes do finado. Depois
morreu um primo do seu inimigo que era a cara dele. Homem bom e pacato,
sem envolvimento em política ou qualquer intriga, ninguém
entendeu a razão da emboscada. Passado algum tempo, o matador foi
à presença do coronel, desculpando-se:
-
O senhor me adiscupe, mas daqueles três que o senhor deu o retrato,
só encontrei dois. Dos três contos que o senhor me deu fico
devendo um que num posso devolver agora porque estou precisado. Mas homem
de palavra, assim que puder lhe devolvo seu dinheiro ou desconto n’outro
serviço.
(Causo
publicado no livro “Morte & Assombração“, de José Elcias Lustosa da Costa,
p. 167-168.)
*José
Elcias Lustosa da Costa. Jornalista e escritor. É cearense
do município de Sobral, sendo membro de tradicional família
sobralense que tem em comum o gosto pelas letras. É autor das seguintes
obras: Arte e Sucesso na Televisão (Editora UNB - DF), O Teatro
Político (Editora Ampersand - RJ), Mapa do Inferno (Editora Thesaurus
- DF), O Texto da Notícia (Editora UNB - DF) e Morte & Assombração
(Editora Premius - CE). Em 2000 concorreu à cadeira nº 6 da
Academia Brasileira de Letras, que pertenceu a Barbosa Lima Sobrinho,
juntamente com Virgílio Moretzsohn Moreira, Yeda Octaviano, Júlio
Romão da Silva, Paschoal Villaboim Filho, Eduardo Fonseca e o jurista
Raymundo Faoro, que acabou sendo eleito para a ABL.
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